Indicadores de Estresse na Gestação

¹Rafaela de Almeida Schiavo, ²Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues

Introdução
O estresse pode ser entendido como uma resposta fisiológica, psicológica e comportamental, de um individuo que procura se adaptar e se ajustar às solicitações internas e/ou externas ao organismo (MARGIS et al., 2003).
Santos e Castro (1998) em uma revisão da literatura encontraram descrições de estresse a partir de três conceituações distintas. A primeira é centrada no ambiente reunindo acontecimentos ou circunstâncias percebidas como ameaçadoras ou perigosas, provocando sentimentos e situações de tensão; a segunda concepção encara o stress como uma resposta, centrando-se nas reações das pessoas aos acontecimentos estressores e, a terceira concepção inclui acontecimentos estressores e respostas de tensão, descrevendo a relação entre a pessoa e o meio que a envolve.
Estresse é um estado que é percebido como uma ameaça ao equilíbrio fisiológico do sujeito. Em geral, a resposta ao estresse é projetada para ter uma duração limitada e as mudanças resultantes desta atividade hormonal e de neurotransmissores, são rapidamente restauradas aos níveis pré-estresse. Por este motivo, o estresse foi denominado por Selye (1936, citado por Santos e Castro, 1998) como Síndrome de Adaptação Geral (SAG).
No entanto, quando o estresse é de natureza crônica e o indivíduo não consegue se adaptar a ele, isso poderá resultar em outros distúrbios, tais como: de ansiedade, depressão, diabetes, alcoolismo, tabagismo e abuso de drogas. Mudanças importantes na vida, tais como novo emprego, casamento, separação e nascimento de um filho, também podem gerar respostas de estresse nos sujeitos.
Em 1956, Selye (citado por CAMELO & ANGERAMI, 2004) descreveu três fases ou estágios do estresse. A primeira, denominada fase de alarme, se inicia quando a pessoa se defronta com um estressor, havendo um desequilíbrio homeostático e, então, o organismo se prepara para "luta ou fuga". É uma reação benéfica ao organismo à medida que prepara para que ele possa atuar em situações de urgência.
Goulart e Lipp (2008) ressaltam que o problema surge quando a prontidão fisiológica não é necessária ou quando é excessiva, característica da fase seguinte, denominada de resistência. Ela ocorre quando a fase de alerta persiste, devido à longa duração ou à grande intensidade do estressor e o organismo se utiliza das reservas de energia adaptativa, na tentativa de se reequilibrar. Se a reserva de energia adaptativa é suficiente, a pessoa se recupera e sai do processo de estresse. Porém, se o estressor exigir mais esforço de adaptação do que é possível para aquele indivíduo, então, o organismo se enfraquece e torna-se vulnerável a doenças (CAMELO & ANGERAMI, 2004; GOULART JR. & LIPP, 2008). Por fim, Selye descreveu a fase da exaustão, quando o organismo encontra-se esgotado pelo excesso de atividades e pelo alto consumo de energia gasto na tentativa de buscar o restabelecimento do equilíbrio homeostático. Tal fase ocorre quando a resistência da pessoa não foi suficiente para lidar com a fonte de estresse ou se houver, concomitantemente, a ocorrência de outros estressores (CAMELO & ANGERAMI, 2004; GOULART JR. & LIPP, 2008).
Lipp (2000) descreveu uma fase intermediária, entre a fase de resistência e a de exaustão, denominada de quase-exaustão. Essa fase caracteriza-se por um enfraquecimento da pessoa que não está conseguindo adaptar-se ou resistir ao estressor, mas que ainda não tenha atingido a exaustão completa (CAMELO & ANGERAMI, 2004; GOULART JR. & LIPP, 2008; LIPP, 2004).
Em decorrência do estresse pode haver o enfraquecimento do sistema imunológico, aumentando as chances de infecções, como também pode afetar os aspectos afetivos emocionais do sujeito, favorecendo o adoecimento. As respostas inadequadas do sistema de estresse também podem prejudicar o crescimento e desenvolvimento do individuo, e pode ser responsável por uma série de problemas endócrinos, metabólicos, auto-imunes e psiquiátricos. Gestantes que são expostas por longo prazo a eventos estressores, são fortes candidatas a apresentarem riscos à sua saúde e a do feto. O feto responde ao estresse materno, com aumento de frequência cardíaca. Além disso, o estresse materno durante a gestação aumenta o risco à pré-disposição ao desenvolvimento de doenças mentais. O estresse crônico durante o período do desenvolvimento do cérebro humano, tem sido, associado a déficits de aprendizagem e comportamentais, além de distúrbios do humor, incluindo a depressão em idades mais avançadas (VAN DER HOVE et al, 2006).
Para Busnel (2002 p.62) existem diferentes tipos de estresse materno que podem causar efeitos no feto e sobre o recém-nascido.
[...] o estresse transmitido pela mãe, através de toda a sua fisiologia, pelas variações do ritmo cardíaco, da pressão arterial, da respiração, eventualmente a sua comunicação e todo o efeito hormonal produzido por uma agressão. [...] estresse de origem externa. São os devidos as drogas, ao fumo e ao alcoolismo. [...] o estresse físico ou fisiológico que pode resultar de surras – violência física a que é submetida a mãe- ao excesso de calor, a grandes infecções, febres altas, desnutrição e ao ruído intenso.
O estresse na gestação, em geral, está associado, aos aborrecimentos diários sentidos no inicio da gravidez e ao medo do parto em meados da gestação. No período gestacional, principalmente a primigesta, passa por diversas situações inesperadas e desconhecidas. O estresse durante a gestação pode ser um fator de risco para o equilíbrio emocional materno e para o desenvolvimento do bebê, inclusive durante o período fetal.
Crianças cujas mães foram expostas a eventos estressores na gravidez, apresentam taxas elevadas de problemas emocionais e comportamentais, sugerindo que o estresse materno no período gestacional pode causar um efeito sobre o feto, que dura até pelo menos meados da infância (O’CONNOR; HERON; GOLDING; GLOVER, 2003; O’CONNOR et al., 2002; GUTTELING et al., 2005; HUIZINK et al., 2002).
Além disso, o estresse no período gestacional pode ser, um fator implicante na perturbação da etiologia do desenvolvimento neural, implicando em psicopatologias tais como: algumas formas de esquizofrenia e transtornos afetivos já na idade adulta (WATSON, et al., 1999; TALGE; NEAL; GLOVER, 2007).
Um estudo realizado por Buitelaar et al (2003) avaliou o estresse de gestantes por meio de questionários e coleta de saliva para verificar a concentração de cortisol como medida endocrinológica do estresse materno. Após o nascimento do bebê os pesquisadores avaliaram o desenvolvimento cognitivo da criança por meio da Bayley Scales of Infant Development (BSID), aos três e oito meses de idade, verificando que os bebês, filhos de mulheres que apresentaram estresse durante a gravidez, apresentaram atrasos cognitivos no desenvolvimento, principalmente os bebês de oito meses de idade. Os autores sugerem que os prejuízos cognitivos, foram mais observados em bebês com oito meses, pois estes apresentam um desenvolvimento maior de consciência e interesse no mundo externo, do que bebê com idade inferior.
Sabe-se hoje, que qualquer substancia ingerida pela grávida é passada ao feto, atravessando a placenta. Desta forma, as perturbações emocionais que provocam alterações neuro-hormonais, também irão repercutir sobre o estado neurofisiológico do feto. Os mesmos são lançados na corrente sanguínea e passados ao feto pelo cordão umbilical, provocando um estado no feto, semelhante àquele sentido pela gestante (WILHEIM, 1997; BUSNEL, 1999). A placenta tem função de barreira intermediária e mensageira ativa do “diálogo” materno-fetal, produzindo e liberando substâncias reguladoras da fisiologia. O estresse fisiológico e patológico influencia tal função, de modo que, o estímulo do estresse endógeno ou exógeno estimule a secreção de Hormônio Liberador de Corticotrofina (HLC) placentário, como resposta adaptativa da placenta para fugir dessas condições adversas (FLORIO et al., 2002).
Sabe-se que a atividade do eixo Hipotálamo-Pituitária-Adrenal (HPA) é aumentado em mulheres grávidas. O estresse pré-natal quando duradouro, pode provocar perturbações no HPA, o cortisol ao atravessar a placenta pode afetar o feto e perturbar o processo de desenvolvimento em curso, podendo desta forma, ocasionar maior vulnerabilidade à psicopatologia em crianças e adolescentes, que foram expostos por longo prazo ao estresse materno, no período fetal (O’CONNOR et.al., 2005; VAN DEN BERGH; MULDER; MENNES; GLOVER, 2005).
Estudos indicam que gestantes expostas ao estresse dão a luz significativamente mais cedo, e a bebês com peso ao nascer, inferior à média dos nascidos de mães não expostas ao estresse (CONDE; FIGUEIREDO, 2003; ARAÚJO; PEREIRA; KAC, 2007; AUSTIN; LEADER, 2000; LOBEL; DUNKEL-SCHETTER; SCRIMSHAW, 1992; WADHWA et al., 1993). Existe uma associação entre a ansiedade materna durante a gravidez e aumento da resistência do índice da artéria uterina, o que poderia explicar as associações entre a ansiedade materna e o baixo peso ao nascer (MANCUSO, et al., 2004; DIEGO et al., 2006; TEXEIRA; FISK; GLOVER, 1999).
O estresse materno na fase pré-natal pode também causar complicações obstétricas, risco de pré-eclampsia, mecônio no liquido amniótico e asfixia fetal (CORREIA; CARVALHO; LINHARES, 2008; KURKI et al., 2000; BURSTEIN et al., 1974; MYERS, 1977; BHAGWANANI et al., 1997) , além da depressão no período gestacional, indicativo para ansiedade e depressão puerperal (CURY; MENEZES, 2006; O’CONNOR; HERON; GLOVER, 2002; BROUWERS; VAN BAAR; POP, 2001; ROSS et al., 2003; MEARES; GRIMWADE; WOOD, 1976).
Pretende-se neste trabalho responder a duas questões: Como é o nível de estresse no terceiro trimestre de gestação? Há diferença entre primigestas e multíparas quanto ao estresse apresentado?
Objetivos
O objetivo deste trabalho é avaliar o estresse de gestantes no terceiro trimestre de gestação e investigar se há diferença no nível de estresse entre primigestas e multíparas.

Método
Este trabalho tem caráter de pesquisa exploratória, onde os dados foram analisados usando o programa estatístico SPSS 17.0. Realizando-se análise descritiva e estatística.
Participantes:
Participaram desta pesquisa, 147 gestantes, usuárias do SUS (Sistema Único de Saúde), que estavam no terceiro trimestre de gestação.
Das participantes 58% eram primigestas e a idade média foi de 21 anos para elas e 27 para as multíparas.
Quanto ao estado civil das primigestas, 66% residiam com o pai do bebê, 17% estavam namorando o pai do bebê e 17% não estavam mais com o pai do bebê.
Já as multíparas, 79% residiam com o pai do bebê, 16% estavam namorando o pai do bebê e 5% não estavam mais com o pai do bebê.
Em relação a escolaridade das primigestas, 13% tinham o ensino fundamental incompleto, 27% fundamental completo, 53% ensino médio completo e 7% ensino superior.
A escolaridade das multíparas era de, 34% ensino fundamental incompleto, 20% fundamental completo, 43% médio completo e 3% superior.
Local:
A coleta de dados foi feita em um Núcleo de Saúde central, de uma cidade de médio porte, do interior paulista.
Materiais:
Foi utilizada uma Entrevista Inicial , elaborada para esse estudo, para a coleta de informações demográficas das participantes e informações sobre a gestação.
Para a avaliação de sintomas de estresses utilizou-se o Inventário de Sintomas de Stress (ISSL) (Lipp, 2000) para adultos acima de 15 anos. O inventário é composto por quatro quadros (quadro 1: 24 horas; quadro 2: uma semana e quadro 3: um mês). Este instrumento pode ser aplicado em grupo de até 20 pessoas ou individualmente. O ISSL contém 15 itens para o quadro 1, sendo 12 itens relacionados a Sintomas Físicos e três itens relacionados à Sintomas Psicológicos; outros 15 itens para o quadro 2, sendo 10 itens relacionados à Sintomas Físicos e cinco itens relacionados à Sintomas Psicológicos e 23 itens para o quadro 3, sendo 12 itens relacionados à Sintomas Físicos e 11 itens relacionados à Sintomas Psicológicos. A aplicação obedeceu às instruções do Manual.
Procedimento
a) Para coleta dos dados:
Todas as gestantes, no terceiro trimestre, foram identificadas no Núcleo de Saúde, junto ao setor de agendamento no dia em que estas tinham consulta marcada com o obstetra ou ecografista. Eram, então, convidadas a participar do presente projeto. O projeto era, então, explicado e, dirimidas as dúvidas. Em caso de aceite, depois de cumpridos os protocolos éticos previstos pelo CONEP (1996) (assinatura do Consentimento Livre e Esclarecido, por exemplo) respondiam ao Inventário de Sintomas de Stress de Lipp (ISSL) e a Entrevista Inicial, antes da consulta médica.
Ao final da aplicação estas foram informadas quanto ao resultado.
b) Para análise dos dados
A tabulação dos dados do ISSL foi realizada a partir das respostas das participantes. Para chegar aos escores brutos somam-se por quadro as respostas P (Psicológicos) e F(Físicos) separadamente, de modo que se tenham três escores físicos e três psicológicos, em um total de seis. Em seguida, somam-se os escores P + F por quadro, de modo que se tenham três escores um para cada quadro do inventário. Se qualquer dos subescores de P + F atingir o critério para o quadro pertinente, pode concluir-se que a pessoa tem estresse.
Para a análise estatística usou-se o programa SPSS 17.0, com o objetivo de verificar se há diferença significativa entre o estresse, a fase do estresse e os sintomas de estresse apresentados por primigestas e multíparas, a partir do Test t (student), para amostras independentes.

Resultados
Os dados coletados na Entrevista Inicial sobre aspectos da gestação indicou que, 12% das primigestas tinham história de aborto anterior, 9% tiveram ameaça de aborto, 15% apresentavam problemas de saúde durante a gestação e 41% planejaram a gravidez. Quanto às multíparas, 28% tinham história de aborto anterior, 8% tiveram ameaça de aborto, 13% apresentaram problemas de saúde durante a gestação e 34% planejaram a gravidez.
Observa-se que a freqüência de abortos anteriores foi maior para o grupo das multíparas, enquanto que as primigestas planejaram mais esta gestação do que as multíparas. Nas demais variáveis analisadas não se observou diferenças entre os grupos.
A Tabela 1 mostra o resultado da avaliação do estresse de gestantes no terceiro trimestre de gestação. Os dados indicam que 85% das participantes apresentaram estresse no terceiro trimestre de gestação, sendo mais freqüente nas multíparas (95%).

Tabela 1. Avaliação do estresse de gestantes no terceiro trimestre de gestação


Independent Samples Test (Testes para Amostras Independentes)
t-test for Equality of Means (Teste t para a igualdade de medias)
t(145) = 2.940; p= 0,004
A análise estatística apontou que há diferença significativa (p<0.05) entre a manifestação do estresse no terceiro trimestre, entre primigestas e multíparas, indicando que, este segundo grupo parece mais vulnerável ao desenvolvimento de estresse.
É apresentado na Tabela 2, as fases do estresse onde as participantes desta pesquisa foram classificadas no terceiro trimestre de gestação.
Nota-se que nenhuma primigesta foi classificada na fase de alerta, 57% (n=49) foram classificadas na fase de resistência, 19% (n=16) estão classificadas na fase de quase exaustão e 2% (n=2) classificadas na fase de exaustão.

Tabela 2. Fases de estresse obtidas por meio do Inventário de Stress de Lipp (ISSL)


Independent Samples Test (Testes para Amostras Independentes)
t-test for Equality of Means (Teste t para a igualdade de medias)
t (145)= 2.34; p=0.020)
Já as multíparas foram classificadas 5% (n=3) na fase de alerta, 61% (n=37) na fase de resistência, 28% (n=17) na fase de quase exaustão e 2% (n= 1) na fase de exaustão.
Das 125 gestantes, 86% da amostra, que apresentaram estresse, foram analisados os níveis do mesmo e, observou-se que 69% delas se encontraram na fase de resistência, e 27% na fase de exaustão. Analisando cada grupo observou-se em resistência que a maior freqüência foi das primigestas 73% e em quase exaustão, foram as multíparas 29%. Nas fases de alerta e exaustão a freqüência foi pequena para os dois grupos.
Houve diferença significativa na fase de estresse que se encontram primigestas e multíparas (p<0.05), é possível dizer que a fase mais predominante do estresse de gestantes é a fase de resistência e a fase que aparece com menor freqüência é a de alerta, quando no terceiro trimestre de gestação.
Observa-se que na Tabela 3, analisando os sintomas de estresse apresentado pelas participantes desta pesquisa no terceiro trimestre de gestação, que 9% (n=8) das primigestas manifestaram sintomas físicos de estresse, enquanto que 66% (n=57) apresentaram sintomas psicológicos e 2% (n=2) apresentaram igualmente sintomas físicos e psicológicos.

Tabela 3. Sintomas de estresse obtidos por meio do Inventário de Stress de Lipp (ISSL)


Independent Samples Test (Testes para Amostras Independentes)
t-test for Equality of Means (Teste t para a igualdade de médias)
t(145) = 3.015; p= 0,003
Já as multíparas 13% (n=8) manifestaram sintomas físicos, 71% (n=43) apresentaram sintomas psicológicos e 12% (n=7) apresentaram sintomas físicos e psicológicos.
Embora se observe que o sintoma psicológico é o que aparece com maior freqüência no terceiro trimestre de gestação 80% das participantes, a análise estatística revela uma diferença significativa quando comparamos os sintomas apresentados por primigestas e multíparas (p<0.05), onde primigestas apresentam uma pequena freqüência dos sintomas físicos e menor freqüência ainda quando classificadas igualmente com sintomas físicos e psicológicos. Já as multíparas apresentam uma freqüência consideravelmente acima das primigestas na manifestação de sintomas físicos e dos sintomas igualmente físicos e psicológicos.

Conclusão
Com os resultados encontrados é possível afirmar que grande parte das gestantes no terceiro trimestre de gestação, estão estressadas. Ser mãe de pelo menos um filho é uma condição favorável ao aparecimento dos sintomas de estresse. A fase de resistência é a mais frequente entre as gestantes que apresentam estresse no terceiro trimestre e a fase de alerta é a que surge com menor freqüência, sendo os sintomas psicológicos o mais presente no estresse manifestado pelas gestantes.
É possível dizer que há diferença significativa entre o estresse apresentado por primigestas e multíparas, sendo as multíparas mais propensas a manifestação do estresse, verificou-se também que a fase de resistência é mais freqüente em primigestas e a fase de quase exaustão é mais freqüente em multíparas. Os sintomas de estresse manifestados por primigestas e multíparas são significativamente diferentes, sendo as multíparas mais propensas a apresentar sintomas físicos e físicos e psicológicos concomitantemente.
Tais resultados apontam a grande necessidade de que mais pesquisas em relação ao estresse na gestação, sejam realizadas em nosso país, é importante que haja trabalhos que investiguem os motivos pelos quais gestantes apresentam estresse no ultimo trimestre, existem muitos trabalhos que levantam alguns pontos que em geral, levam grávidas a apresentarem transtornos do humor e de ansiedade, mas há poucos trabalhos que investigaram quais poderiam ser os possíveis eventos estressores durante a gestação.
É importante frisar que há poucos estudos psicológicos nacionais que investigam o estresse gestacional, mas há muita literatura estrangeira, principalmente apontando os prejuízos que o estresse pode causar na mãe, no feto, e ao longo do ciclo vital do sujeito que foi exposto na vida uterina ao estresse materno.
Pesquisas estrangeiras não revelam números tão altos de participantes com estresse, como os encontrados neste trabalho.
Algumas hipóteses em relação aos possíveis eventos estressores no final da gestação poderiam ser o fato, de que existe uma pré-concepção sociocultural sobre o parto, onde as mulheres imaginam que sentirão uma dor terrível, o medo da mudança da rotina de vida após nascimento do bebê, a alta ansiedade, preocupação financeira, profissional, conjugal, entre outras.
É importante ressaltar que as participantes desta pesquisa em sua maioria são da classe popular, é importante que pesquisas sejam realizadas também com mulheres de classe média alta e alta, para verificar se estas também apresentam estresse no ultimo trimestre de gestação.
Infelizmente no Brasil não é dada a devida atenção pré-natal, às gestantes, o pré-natal psicológico não é realizado na maioria dos atendimentos.
Sabe-se hoje que a maternidade é um período potencial para o desenvolvimento de crise, mas parece que a maioria dos profissionais da saúde, tem negligenciado este fato, a fase onde mais há ocorrências de internações e desencadeamento de problemas psiquiátricos em mulheres, é durante a gravidez e pós-parto.
O ideário de que a maternidade é uma fase “linda e maravilhosa” na vida das mulheres, pode ser um dos fatores que contribuem para esta negligencia por parte dos profissionais da saúde. O mito que foi criado historicamente em torno da maternidade, como sendo uma “Benção de Deus”, “O desejo de toda mulher”, entre outros, faz com que a própria gestante ao ter sentimentos hostis em relação a gravidez, ou em relação ao próprio bebê que espera, sinta um forte sentimento de culpa, o que pode levar ao desenvolvimento do estresse, principalmente se a mulher já é mãe e engravida novamente, em um momento não apropriado.
Este ideário construído coloca em risco a saúde da gestante, e a do bebê, pois, os próprios profissionais da saúde, não estão preparados para ouvir que ela não está feliz com a gravidez naquele momento, ou qualquer outro evento desagradável que possa ter ocorrido. Muitas são mal compreendidas pela equipe que a atende, principalmente quando esta mulher é atendida pelo Sistema Único de Saúde, onde os profissionais recebem alta demanda de pacientes e não dispõem de tempo hábil para um atendimento clínico mais atencioso e humanitário.
É de máxima importância e urgência que o atendimento à gestante ganhe nova atenção. Já é sabido que o ciclo gravídico puerperal é marcado por alterações emocionais, características desse período, no entanto, há possibilidade de desencadear transtornos psíquicos significativos comprometendo a saúde mental da mulher.
A fase de gestação, é um período potencial para o desenvolvimento de crise, existe um número alto de pesquisas que apontam porcentagem considerável de mulheres que apresentam transtornos psiquiátricos nesta fase do desenvolvimento.
Havendo tantas pesquisas, nacionais e internacionais apontando números alarmantes de mulheres com sua saúde mental comprometida, durante o período gestacional, não é mais possível e aceitável que os profissionais da saúde continuem a negligenciar a importância de se fazer um acompanhamento psicológico da grávida.
Só por meio do pré-natal médico e psicológico, é que se poderá prevenir, os riscos a saúde materno-infantil, tais como; o nascimento prematuro, abaixo do peso, complicações obstétricas, atrasos no desenvolvimento infantil, ansiedade e ou depressão pós-parto, psicose puerperal, entre outros.
Organizar programas de atenção à gestante poderia minimizar o estresse da grávida. Os programas de atenção à gestante têm entre seus objetivos o informar a gestante, familiares ou casais grávidos, quanto aos aspectos biopsicossociais da gestação, parto e puerpério, além de proporcionar um espaço para que os integrantes possam partilhar sua experiência gestacional, suas angústias, dúvidas, necessidades etc.
Tais programas são comumente chamados de Cursos para Gestante, de Psicoprofilaxia, de Pré-natal Psicológico, de Preparação para o Parto, entre outros nomes. Em geral os encontros são ministrados por profissionais da saúde.
Pesquisas sugerem que medidas de prevenção como o oferecimento de programas de atenção à gestante e apoio psicossocial poderiam, minimizar os problemas decorrentes de estresse na gravidez, contribuindo para uma vivência mais saudável da gestação, prevenindo perturbações obstétricas e patológicas, para a mãe e bebê.

Referência
ARAUJO, D. M. R; PEREIRA, N.L; KAC, G.. Ansiedade na gestação, prematuridade e baixo peso ao nascer: uma visão sistemática da literatura. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.23, n.4, p.747-756, abr. 2007.
AUSTIN, M. P; LEADER, L. Maternal stress and obstetric and infant outcomes: epidemiological findings and neuroendocrine mechanisms. Aust N Z J Obstet Gynaecol, v.40, n.3, p. 331-337, 2000.
BHAGWANANI, S. G et al. Relationship between prenatal anxiety and perinatal outcome in nulliparous women: a prospective study. Journal of the National Medical Association, v.89, n.2, p.93-98, 1997.
BROUWERS, E. P. M; VAN BAAR, A. L; POP, V. J. M. Maternal anxiety during pregnancy and subsequent infant development. Infant Behavior & Development, v.24, n.1, p. 95-106, 2001. BUITELAAR, J. K., et al. Prenatal stress and cognitive development and temperament in infants. Neurobiology of Aging, v.24, n.1, p. S53-S60, 2003.
BURSTEIN, I et al. Anxiety, pregnancy, labor, and the neonate. Am. J. Obstet. Gynecol, v.118, n.2, p. 195- 199, 1974.
BUSNEL, M. C. Os efeitos do stress materno sobre o feto e o recém-nascido. In: WILHEIM, J. (Org). Relação mãe-feto visão atual das neurociências. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002. p. 58-70.
CARMELO, S. H. H; ANGERAMI, E. L.S. Sintomas de estresse nos trabalhadores atuantes em cinco núcleos de saúde da família. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v.12. n.1, p.14-21, jan-feb. 2004.
CONDE, A; FIGUEIREDO, B. Ansiedade na gravidez: fatores de risco e implicações para a saúde e bem estar da mãe. Psiquiatria Clínica, v. 24, n. 3, p.197-209, 2003. Disponível em: https://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/4217
CORREIA, L. L; CARVALHO, A. E. V; LINHARES, M. B. M. Conteúdos verbais expressos por mães de bebês prematuros com sintomas emocionais clínicos. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 16, n. 1, p. 64-70, jan-feb. 2008.
CURY, A. F; MENEZES, P. R. Ansiedade no puerpério: prevalência e fatores de risco. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, Rio de Janeiro, v. 28, n. 3, p. 171-178, mar. 2006.
DIEGO, M. A et al. Maternal psychological distress, prenatal cortisou and fetal weigth. Psychosomatic Medicine, v.68, n.5, p. 747-753, 2006.
FLORIO, P et al. Placental stress factors and maternal-fetal adaptive response. Endocrine, v.19, n.1, p. 91-102, oct. 2002.
GOULART JUNIOR, E; LIPP, M. E. N. Estresse entre professoras do ensino fundamental de escolas públicas estaduais. Psicologia em Estudo, Maringá, v.13, n.4, p.847-857, out-dez. 2008.
GUTTELING, B. M et al. The effects of prenatal stress on temperament and problem behavior of 27-month-old toddlers. European Child & Adolescent Psychiatric, v. 14, n. 1, p. 41-51, 2005.
HUIZINK, A. C et al. Psychological measures of prenatal stress as predictors of infant temperament. J. Am. Acad. Child Adolesc. Psychiatric, v. 41, n. 9, p.1078-1085, 2002. KURKI, T et al. Depression and anxiety in early pregnancy and risk for preeclampsia. Obstetrics & Gynecology, v.95, n.4, p. 487- 490, april 2000.
LIPP, M. N. Manual do Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp (ISSL) . São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
LOBEL, M; DUNKEL-SCHETTER, C, SCRIMSHAW, S. C. M. Prenatal maternal stress and prematurity: A prospective study of socioeconomically disadvantaged women. Health Psychology, v.11, n.1, p.32-40, 1992.
MANCUSO, R.A et al. Maternal prenatal anxiety and corticotropin- releasing hormone associated with timing of delivery. Psychosomatic Medicine, v.66, n.5, p. 762-769, 2004.
MARGIS, R et al. Relação entre estressores, estresse e ansiedade. Rev. Psiquiatria. RS, v.25, n (suplemento 1), p.65-74, Abr 2003.
MEARES, R; GRIMWADE, J; WOOD, C. A possible relationship between anxiety in pregnancy and puerperal depression. Journal of Psychosomatic Research, v.20, n.6, p.605-610, 1976. MONK, C et al. Effects of women’s stress-elicited physiological activity and chronic anxiety on fetal heart rate. Developmental and Behavioral Pediatrics. USA, v.24, n.1, p.32-38, Feb 2003.
MYERS, R. E. Production of fetal asphyxia by maternal psychological stress. Pav. J. Biol. Sci, v.12, n.1, p.51-62, jan/mar. 1977.
O’CONNOR, T. G; HERON, J; CLOVER, V. Antenatal Anxiety Predicts Child Behavioral/Emotional Problems Independently of Postnatal Depression. Journal of the American Academy of Child & Adolescent Psychiatry, v. 41, n. 12, p. 1470-1477, Dec. 2002.
O’CONNOR, T. G et.al. Maternal antenatal anxiety and children's behavioural/emotional problems at 4 years: Report from the Avon Longitudinal Study of Parents and Children. The British Journal of Psychiatry, v. 180, n. 6. p. 502-508, June. 2002.
O’CONNOR, T. G; HERON, J; GOLDING, J; GLOVER, V. Maternal antenatal anxiety and behavioural/emotional problems in children: a test of a programming hypothesis. Child Psychol Psychiatry, v. 44, n. 7, p. 1025-1036, Oct. 2003.
58. O’CONNOR, T. G et al. Prenatal anxiety predicts individual differences in cortisol in pre-adolescent children. Biological Psychiatric, v.58, n.3, p. 211-217, Aug 2005.
ROSS, L.E et al. Measurement issues in postpartum depression part 1: anxiety as a feature of postpartum depression. Archives of women’s Mental Health, Austria, v.6, n.1, p.51-57, feb. 2003.
SANTOS, A. M; CASTRO, J. J. Stress. Análise Psicológica, v.4, n.16, p. 675-690, 1998.
SCHMIDT, E. B; PICCOLOTO, N. M; MÜLLER, M. C. Depressão pós-parto: fatores de risco e repercussões no desenvolvimento infantil. Psico-USF, v.10, n.1, p.61-68, jan/jun. 2005.
TALGE, N. M; NEAL, C; GLOVER, V. Antenatal maternal stress and long-term effects on child neurodevelopment : how and why? Journal of Child Psychology and Psychiatry, v. 48, n. 3-4, p. 245-261, Mar-Apr 2007.
TEXEIRA, J. M. A; FISK, N. M; GLOVER, V. Association between maternal anxiety in pregnancy and increased uterine artery resistance index: cohort based study. British Medical Journal, v. 318 16 de Janeiro p. 153-157, 1999. Disponível em: http://www.bmj.com/cgi/reprint/318/7177/153.pdf. Acesso em: 03 jul. 2008.
VAN DEN BERGH, B. R. H; MULDER, E. J.H; MENNES, M; GLOVER, V. Antenatal maternal anxiety and stress and the neurobehavioral development of the fetus and child: links and possible mechanisms. A review. Neuroscience & Biobehavioral Reviews, v.29, n.2, p.237-258 apr 2005.
VAN DEN HOVE, D. L.A et al. Prenatal stress and neonatal rat brain development. Neuroscience, v. 137, n. 1, p. 145-155, 2006.
WADHWA, P. D et al. The association between prenatal stress and infant birth weight and gestational age at birth: a prospective investigation. Am J Obstet Gynecol, v.169, n.4, p.858-865, oct 1993.
WATSON, J. B et al. Prenatal teratogens and the development of adult mental illness. Development and Psychopathology, v.11, n. 3, p. 457-466, 1999.
WILHEIM, J. O que é psicologia pré-natal. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.

1Psicóloga formada pela Universidade Estadual Paulista UNESP/Bauru. Discente do programa de mestrado em psicologia do desenvolvimento e aprendizagem da UNESP/Bauru. Professora na Faculdades Integradas de Ourinhos-FIO. Professora na Universidade Estadual Paulista UNESP/Bauru.

Copyright © ISMA-BR 2001
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução total ou parcial.
ISMA-BR - International Stress Management Association no Brasil
CNPJ: 03.915.909/0001-68
Rua Padre Chagas, 185 conj 1104
Moinhos de Vento
90570-080 Porto Alegre, RS
+55 51 3222-2441
stress@ismabrasil.com.br