Implicações da Percepção de Qualidade de Vida no Trabalho sobre os Sintomas de Dor e Desconforto Musculoesquelético no Policial Militar de Alagoas

Deivson Cavalcante Gomes de Olivera 1
Francinese Raquel Vieira Silva 2


Resumo

Este trabalho tem como objetivo apresentar a mensuração da percepção de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) do policial militar de Alagoas, bem como verificar suas repercussões sobre os sintomas de dor e desconforto musculoesquelético. Participaram desta pesquisa 55 policiais militares, de ambos os sexos, com idades entre 33 a 59 anos, sendo 22 oficiais e 33 praças. A QVT foi analisada através do IA_QVT e os sintomas musculoesqueléticos através do Questionário Nórdico de Sintomas Osteomusculares. Os policiais participantes deste estudo apresentaram uma média de QVT de 6,57(±1,65), percebendo a atividade que realizam como em um estado de bem-estar moderado para QVT. Os fatores estruturantes de QVT que exerceram influência positiva para o bem-estar dos policiais foram o Elo Trabalho-vida social e as Relações Socioprofissionais de Trabalho. As Condições de Trabalho e o Reconhecimento e Crescimento Profissional foram os fatores que apresentaram maior prejuízo sobre a QVT. A coluna lombar foi a região do corpo que apresentou maior número de queixas musculoesqueléticas, seguido pelo pescoço, joelhos e ombros. Além disto, pudemos verificar que o grupo de policiais com melhor percepção de QTV na atividade desenvolvida apresentou, em geral, menores percentuais de queixas de dor e desconforto osteomioarticular. Sendo assim, faz-se necessário maiores estudos nessa área a fim de que sejam adotadas medidas de promoção da QVT nos profissionais de segurança pública a fim de promover melhores condições de trabalho destes trabalhadores, bem como novas estratégias de reconhecimento institucional e oportunidades de crescimento profissional mais efetivas.

Palavras-Chave: Polícia Militar. Qualidade de Vida. Dor Musculoesquelética. Saúde do Trabalhador. Ergonomia

Introdução

O trabalho, além de um meio necessário para manter as condições de vida humana, exerce um importante papel na construção do bem estar psicossocial do indivíduo na medida em que constitui um elemento eficaz de interação social do homem e na afirmação de si ante os demais, verificada na expressão e significado de sua atividade. (ERDMANN; NASCIMENTO, 2002). Entretanto, a atividade laborativa pode submeter os trabalhadores a condições de riscos e agravos à saúde, comprometendo o desempenho humano em seu âmbito profissional e social, além de causar afastamentos temporários sucessivos e até mesmo definitivos de sua atividade. (PIZÓN; TORRES, 2005). De acordo com Minayo, Assis e Oliveira (2011) condições desfavoráveis de trabalho podem comprometer significativamente a saúde e a qualidade de vida dos indivíduos na medida em que demandam sobrecargas físicas, cognitivas e emocionais.
Entende-se que a atividade policial militar por si só, possui características de risco à qualidade de vida no trabalho e à saúde dos profissionais de segurança pública na medida em que estes convivem diariamente com a violência e o risco de morte, além de sobrecarga e condições inadequadas de trabalho e estresse.
Fatores relacionados ao trabalho tais como o ambiente e questões organizacionais podem aumentar a probabilidade de desenvolvimento de Doenças Osteomioarticulares Relacionadas ao Trabalho. (FISHER; KONKEL; HARVEY, 2004). Minayo, Assis e Oliveira (2011) descrevem alta prevalência dos agravos osteomusculares em policiais militares e os impactos dos sintomas de dor e desconforto musculoesquelético na atividade do policial.
De acordo com Ferreira (2012), a ausência de adequadas condições laborais está diretamente relacionada com a presença de fontes de mal-estar no ambiente de trabalho, que por sua vez, podem ter um significante papel no adoecimento físico e mental relacionado ao trabalho.
Fatores relacionados ao trabalho tais como o ambiente e questões organizacionais podem aumentar a probabilidade de desenvolvimento de sintomas de dor e desconforto musculoesquelético. As relevantes consequências sociais desencadeadas por tais disfunções e o aumento cada vez mais significativo da incidência destas no nosso meio, tem tornado as DORT um importante problema de saúde pública. (FISHER; KONKEL; HARVEY, 2004).
Diante do exposto, questiona-se: de que forma a percepção de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) se relaciona com o surgimento de sintomas de dor e desconforto musculoesquelético?
Considerando a relevância do serviço prestado pela Polícia Militar para o bem estar da sociedade alagoana, faz-se necessária à realização de estudos que descrevam o nível da qualidade de vida no trabalho ao qual estes profissionais estão expostos, bem como a distribuição da prevalência dos sintomas de dor e desconforto musculoesquelético nesta população.
Com o intuito de analisar a percepção de Qualidade de Vida no Trabalho em policiais militares de Alagoas e suas eventuais relações com os sintomas de dor e desconforto musculoesquelético, esse estudo objetiva mensurar a percepção de QVT sobre as condições de trabalho, a organização do trabalho, as relações socioprofissionais do trabalho, o reconhecimento e crescimento profissional e o elo trabalho-vida social; além de identificar a prevalência dos sintomas de dor e desconforto musculoesquelético nestes profissionais.

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa descritiva de abordagem quantitativa. A amostra deste estudo foi selecionada por conveniência. Os dados foram coletados entre agosto e setembro de 2017, na Academia de Polícia Militar Senador Arnon de Melo, tendo como público alvo policiais militares do quadro combatente, de ambos os sexos, considerados aptos para o trabalho pela Junta Médica da Corporação. Participaram da pesquisa 55 policiais militares, sendo 22 oficiais e 33 praças, com idades entre 33 a 59 anos, de ambos os sexos, sendo 11 policiais do sexo feminino e 44 do sexo masculino.
Para avaliar a Percepção da Qualidade de Vida no Trabalho dos policias militares foi aplicado um questionário baseado no Inventário de Avaliação em Qualidade de Vida (IA_QVT), proposto por Ferreira (2012). O IA_QVT consiste em um instrumento de pesquisa validado que permite conhecer o que pensam os servidores sobre Qualidade de Vida no Trabalho nos ambientes e tarefas avaliados. O questionário foi constituído de 58 questões distribuídas em cinco fatores que estruturam conceitualmente a QVT sob a ótica dos respondentes: condições de trabalho; organização do trabalho; relações socioprofissionais de trabalho; reconhecimento e crescimento profissional; e elo trabalho-vida social. Os dados foram analisados a partir de uma escala psicométrica do tipo Likert onde os servidores foram convidados a marcar com um x a posição que melhor representa sua opinião quanto a cada item dos fatores estruturantes de QVT.
Para identificação dos sintomas de dor e desconforto musculoesquelético foi aplicado o Questionário Nórdico de Sintomas Osteomusculares desenvolvido por Kuorinka et al (1987) no qual foi solicitado aos participantes assinalar as regiões anatômicas que apresentam estes sintomas considerando os 12 meses e 7 dias precedentes. Os dados foram estruturados em planilhas do Microsoft Oficce Excel® e apresentados por meio de tabelas e gráficos.

Marco Conceitual

A Atividade Policial Militar: Considerações Iniciais

De acordo com a Constituição Federal de 1988, cabem às polícias militares o papel de policiamento ostensivo e manutenção da ordem pública. As atividades relacionadas com o policiamento ostensivo compõem a presença fardada na sociedade a fim de prevenir delitos e prender criminosos. O trabalho de preservação da ordem pública busca garantir ao cidadão o exercício de seus direitos e garantias fundamentais, o funcionamento das instituições públicas, e o patrimônio público e privado.
Os policiais militares, no exercício da atividade de combate à violência e manutenção da ordem pública se diferenciam dos demais trabalhadores na medida em que exercem suas atividades laborais em diversos ambientes e situações de trabalho. Além disso, estão expostos rotineiramente a situações de risco à saúde e à vida, tais como rotina, horas extras, estresse, insegurança, equipamentos inadequados, entre outras. (FERREIRA; AUGUSTO; SILVA, 2008; GONÇALVES, VEIGA; RODRIGUES, 2012). Estudos recentes têm relatado um risco maior de surgimento de determinadas doenças e de morte em policiais militares quando comparados com demais profissionais de segurança pública, como policiais civis e guardas municipais. (MINAYO; ASSIS E OLIVEIRA, 2011; MINAYO e SOUZA, 2005). No campo da saúde e segurança do trabalho, entende-se por risco a probabilidade, medida de exposição, situação ou fator que determina efeitos adversos sobre a saúde e capacidade funcional do trabalhador. (MACHADO, 1997). Os riscos ocupacionais inerentes à determinada atividade laborativa são particularmente altos quando a organização e o planejamento do trabalho são inadequados. Diversos estudos. (MAGRINI; GRANA; VICCENTINI, 2014; CANDURA et al., 2006) relataram a diversidade de riscos ocupacionais de natureza física, química, biológica e ergonômica, presentes no exercício da função em instituições de segurança pública, em decorrência do combate a criminalidade e da manutenção da ordem pública. Pesquisa recente desenvolvida no âmbito da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Alagoas descreveu situações de trabalho nas quais os policiais militares estão expostos a riscos de diversas naturezas, sem o correto uso de equipamentos de proteção individual. (SILVA, 2015).
Segundo Minayo, Assis e Oliveira (2011), no caso da atividade policial militar, o risco é mais do que uma medida de exposição, é um conceito estruturante da própria profissão, considerando o risco de morte vivenciado por esses profissionais não apenas durante o exercício do cargo, mas também após a jornada de trabalho. Estes profissionais têm consciência de que perigo e audácia são inerentes aos atributos de suas atividades. (MINAYO; SOUSA; CONSTANTINO, 2007).

Qualidade de Vida no Trabalho

De acordo com Ferreira (2012) não há um consenso entre os teóricos sobre o que seria conceitualmente Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), considerando o caráter subjetivo e individual da percepção dos trabalhadores sobre o tema.
Na abordagem contra hegemônica proposta por Ferreira (2012), a QVT possui um caráter preventivo em detrimento do assistencialista. Segundo esse autor, o conceito de Qualidade de Vida no Trabalho é apresentado sob a ótica da organização, e sob a ótica dos trabalhadores.
Quanto à ótica das organizações, Ferreira (2012) descreve a QVT como um preceito de gestão organizacional, no qual um conjunto de normas, diretrizes e práticas de trabalho surgem com o objetivo de promover o bem-estar individual e coletivo, no âmbito das condições de trabalho, da organização do trabalho e das relações socioprofissionais de trabalho. Na perspectiva da ótica dos trabalhadores, a QVT expressa-se através das representações globais que estes constroem a partir de vivências de bem-estar no trabalho, de reconhecimento institucional, das oportunidades de crescimento profissional e de respeito às individualidades dos trabalhadores.
Sendo assim, pode-se entender QVT como um atributo do trabalho que proporcione ambiente e condições laborativas favoráveis à realização da atividade, onde os indivíduos estejam seguros, expressem satisfação e bem estar e estejam em condições de se desenvolverem enquanto seres humanos, encontrando sentido no trabalho e reconhecimento institucional e social. (COELHO, 2014).
Segundo Ferreira (2012) as representações de bem-estar e mal-estar no trabalho que compõem a QVT possuem cinco fatores estruturantes: condições de trabalho; organização do trabalho; relações socioprofissionais de trabalho; reconhecimento e crescimento profissional; e elo trabalho-vida social, expressos através da representação pessoal de cada trabalhador no ato da pesquisa.
Estudos têm demonstrado um grau de percepção baixo de qualidade de vida no trabalho por parte dos profissionais de segurança pública, especialmente nas polícias militares. (ASFORA, 2004; COELHO, 2014).

Impactos da Atividade Policial na Saúde do Trabalhador de Segurança Pública

Considerando a característica peculiar da atividade policial, o trabalhador de segurança pública está exposto a diversos agravos a sua saúde física e mental. Entretanto, diante da relevância do serviço desenvolvido por este grupo de trabalhadores, é exigido destes um elevado nível de saúde para estar apto a suportar as sobrecargas impostas pelos ambientes de trabalho e pela natureza da atividade realizada, tais como extensas jornadas de trabalho, problemas ergonômicos de natureza biomecânica e organizacional, e exposição a inúmeros riscos ocupacionais. (SILVA; LIMA; GÓES, 2012).
Com relação às sobrecargas biomecânicas de trabalho nas atividades operacionais, observa-se o transporte frequente de peso, considerando a carga decorrente do uso de equipamentos de proteção individual como os coletes de proteção balística e cinto de guarnição, e a adoção de posturas inadequadas por tempo prolongado na posição de pé, durante o policiamento ostensivo, ou sentada, em viaturas. De acordo com Gonçalves, Veiga e Rodrigues (2012), os policias transportam frequentemente uma carga de mais de 5 quilos em decorrência do uso habitual de armamentos e equipamentos de proteção individual.
Além disso, parcela do efetivo policial está empregada em atividades administrativas em postos de trabalho informatizado, o que demanda exigências biomecânicas em coluna vertebral lombar e membros superiores principalmente. (VASCONCELOS, 2007). Segundo Fisher e Gibson (2008), a maior incidência de queixas musculoesqueléticas em segmentos da coluna vertebral e membros superiores em trabalhadores administrativos com uso prolongado do computador e em posição sentada pode estar relacionada com o aumento da pressão sobre os discos intervertebrais, e, sobretudo com a presença de sobrecarga estática de músculos da coluna vertebral e da cintura escapular, associada à solicitação repetitiva da musculatura de membros superiores.
Silva (2015) descreveu uma maior prevalência de queixas de dor e desconforto musculoesquelético em policiais militares do Estado de Alagoas nas regiões da coluna vertebral, principalmente na região lombar, e em membros superiores, corroborando com resultados semelhantes encontrados em outras corporações policiais militares. (MINAYO; ASSIS; OLIVEIRA, 2011). Sintomas de dor e desconforto osteomioarticular nestas regiões do corpo podem estar relacionados às sobrecargas biomecânicas as quais estes profissionais estão expostos durante a jornada de trabalho. Traumas ocorridos durante treinamentos físicos realizados pela tropa frequentemente também podem ser mecanismos de lesões ósseas, ligamentares e musculares, especialmente em membros inferiores. (CALASANS; BORIN; PEIXOTO, 2013).
Quanto à saúde mental, os distúrbios neuropsíquicos apresentam uma grande prevalência em policiais militares, que apresentam elevados índices de estresse, ansiedade, síndrome do pânico e depressão, além do uso abusivo de álcool e outras drogas. (FERREIRA; AUGUSTO; SILVA, 2008). Segundo Silva, Lima e Goes (2014), os principais fatores responsáveis pelo sofrimento psíquico neste grupo de trabalhadores estão relacionados a aspectos organizacionais, reflexo da sobrecarga de jornada e variabilidade de turno de trabalho, às experiências típicas da atuação policial militar, resultado do enfrentamento cotidiano com a violência urbana. O policial militar lida cotidianamente com a violência, a agressividade e com a morte, estando constantemente exposto ao perigo e devendo intervir cotidianamente em situações de conflito e problemas humanos, o que demanda uma elevada sobrecarga mental de trabalho e estresse. (GONÇALVES; VEIGA; RODRIGUES, 2012).

Resultados

A média global de QVT na população estudada foi 6,57(±1,65), o que caracteriza o grupo em geral em um estado de bem estar moderado. Os dados revelam que 42% dos policiais se percebem nesta condição, enquanto que 22% como bem-estar intenso, 18% em uma zona de transição com tendência positiva, 11% em zona de transição com tendência negativa e 7% em estado de mal-estar moderado (Gráfico 1). Coelho e col. (2016) em estudo com 1.027 policiais militares do Distrito Federal identificaram uma média global de QVT de 3,65, menor do que em nosso estudo, de forma que a maioria destes policiais perceberam o nível de QVT como um estado de mal-estar moderado. A diferença no escore apresentado pode estar relacionado com o fato dos policiais participantes deste estudo estarem no momento da pesquisa realizando cursos da carreira militar, menos engajados portanto com as atividades operacionais inerente à atividade policial. Além disso, não identificamos diferença relevante entre a média de QVT encontrada entre os oficiais e as praças participantes deste estudo.

Ao analisar a maneira como cada fator estruturante de QVT interfere na percepção global de qualidade de vida no trabalho dos policiais militares, podemos observar que os itens referentes às Condições de Trabalho apresentaram menor valor médio (5,95), acompanhado dos itens relacionados ao fator Reconhecimento e Crescimento Profissional (6,23) e Organização do Trabalho (6,36) (Gráfico 2).
Da mesma forma, Coelho e col. (2016), descreveram os fatores Reconhecimento e Crescimento Profissional e Condições de Trabalho como os que exercem maior influência negativa na QVT de policiais militares, enquanto que o Elo Trabalho-vida social e as Relações Socioprofissionais de Trabalho apresentam maior relevância como fatores promotores de bem-estar e qualidade de vida no trabalho dos policiais.

Desta forma, nossos resultados sugerem que as condições de trabalho representam maior prejuízo sobre a percepção de bem-estar e qualidade de vida no trabalho dos policiais no exercício de suas funções, principalmente no que se refere aos itens relacionados com mobiliários no local de trabalho (5,13) e apoio técnico para executar as tarefas (5,41). Esse resultado também foi observado por Silva (2015), que descreveu a falta de estrutura e a falta de equipamentos como os principais fatores causadores de insatisfação com o trabalho em policiais militares de Alagoas. Pudemos observar também que os itens relacionados com o Reconhecimento e Crescimento Profissional apresentaram-se como fatores posicionados em uma zona de transição com tendência negativa, principalmente quando questionados sobre os itens: grau de reconhecimento do trabalho pela PMAL, sensação que existo para a PMAL e a qualidade das oportunidades de crescimento profissional.
Nossos resultados corroboram com pesquisa realizada pela Secretaria de Estado de Defesa Social de Alagoas. (SILVA, 2015), onde 79% dos policiais militares relataram “nunca” ou “apenas às vezes” serem reconhecidos pela instituição que trabalham e 63,83% apontam as dificuldades de promoções como a principal causa de desmotivação no trabalho. Observa-se que este problema tem sido relatado em outras corporações policiais militares, como por exemplo na Polícia Militar do Distrito Federal, onde Coelho (2003) relatou como grave os problemas relacionados com o reconhecimento pelo trabalho e as oportunidades de crescimento profissional. De acordo com Aazami e col. (2015), fatores relacionados com a satisfação com o trabalho tais como o reconhecimento profissional e oportunidades de crescimento estão relacionados com o adoecimento físico e emocional dos trabalhadores, especialmente com distúrbios do sono, dor de cabeça e problemas gastrointestinais, o que pode trazer significativos prejuízos à capacidade profissional dos trabalhadores.
Por outro lado, os fatores Elo Trabalho e Vida Social (7,6) e Relações Socioprofissionais (7,32) representaram as dimensões que exercem maior influência positiva sobre a Qualidade de Vida no Trabalho nos policiais militares, caracterizando, portanto, como os itens mais relevantes para o sentimento de prazer e bem-estar com a atividade desenvolvida.
O Suporte social proveniente dos colegas de trabalho também representou um importante aspecto positivo do conteúdo do trabalho desenvolvido por policiais militares em pesquisa realizada por Ferreira, Bonfim e Augusto (2012), onde foi identificado uma boa percepção quanto à preocupação com o bem-estar entre os pares. Segundo Coelho e col. (2016) o relacionamento entre os pares, especialmente os colegas de equipe, podem representar uma estratégia de mediação contribuindo para que os policias militares se mantenham íntegros física, psicológica e socialmente.
Quanto à distribuição do número de queixas de dor e desconforto musculoesquelético nas regiões do corpo, a coluna lombar apresentou maior prevalência, seguida do pescoço, e das articulações dos joelhos e ombros (Tabela 1). Neste sentido, nossos resultados são semelhantes ao relatado por Silva (2015) e por Minayo, Assis e Oliveira (2011) que descreveu a coluna lombar como a região mais acometida por queixas musculoesqueléticas, acompanhada pelo pescoço e pelas articulações dos membros superiores, especialmente os ombros. No entanto, a prevalência de dor na nossa amostra foi percentualmente menor do que a apresentada naqueles estudos.


Estudos têm demonstrado elevada incidência dos distúrbios osteomioarticulares relacionados ao trabalho em diversas categorias profissionais. Santos e col. (2016) e Minayo, Assis e Oliveira (2011) descreveram as disfunções musculoesqueléticas como o grupo de doenças com maior prevalência entre os policiais militares.
A maior incidência de dor nestas regiões do corpo pode estar relacionada com as sobrecargas biomecânicas presentes na atividade policial. Nas atividades operacionais, a coluna lombar encontra-se frequentemente em sobrecarga considerando o transporte de peso em decorrência do uso do colete balístico e de armamentos e equipamentos de proteção individual do cinto de guarnição. (RAMSTRAND e col., 2016). Além disto, parte do efetivo permanece na posição sentada por tempo prologado nas rondas em viaturas e motos. A posição sentada por tempo prolongado está associada ao aumento da sobrecarga de peso sobre as vertebras lombares, que associada a vibração dos motores dos automóveis e motocicletas, acarreta em maior risco de desenvolvimento de disfunções musculoesqueléticas nesta região do corpo. (GRUEVSKI e col., 2016).
Além das atividades operacionais, parcela do efetivo das corporações militares estão empregadas em atividades administrativas em postos de trabalho informatizado, acarretando sobrecargas biomecânicas sobre a coluna vertebral e membros superiores (VASCONCELOS, 2007), possivelmente devido ao aumento da pressão discal em vertebras lombares observadas na posição sentada e a sobrecarga estática em grupamentos musculares da coluna vertebral e cintura escapular e à sobrecarga dinâmica em músculos do punho/mãos. (FISHER E GIBSON, 2008).
Ao analisarmos o índice de queixas osteomioarticulares em policiais cuja percepção de QVT foi caracterizada como em Estado de bem-estar dominante, observamos que, em geral, este grupo de policiais apresentaram menores percentuais de dor musculoesquelética quando comparado com os demais. Este dado reforça a necessidade de iniciativas que promovam melhor condições de trabalho, bem como estratégias de reconhecimento e crescimento profissional no âmbito da corporação, considerando os impactos sobre a saúde e o bem-estar dos policias militares e consequentemente na qualidade do serviço prestado para a sociedade.

Considerações Finais

Com a aplicação do Inventario de Avaliação de Qualidade de Vida no Trabalho, pudemos observar que a maioria dos policiais militares de Alagoas participantes deste estudo percebem-se em um estado de Bem-estar moderado. As condições de Trabalho e o grau de Reconhecimento e Crescimento Profissional são os fatores que mais exercem prejuízo na qualidade de vida no trabalho destes profissionais. Por outro lado, os itens relacionados ao Elo Trabalho-vida social e às Relações Socioprofissionais de Trabalho exercem uma importante influência positiva sobre a percepção de bem-estar com a atividade desenvolvida pelos policiais.
Ao analisar a relação entre a percepção de QVT e a prevalência de dor e desconforto musculoesquelético, foi possível verificar que o grupo de policiais que apresentaram maiores escores de QVT, considerados portanto como em estado de bem-estar dominante, apresentaram menores índices de queixas destes sintomas. Portanto, pôde-se confirmar a hipótese da nossa pesquisa, na medida em que foi possível estabelecer uma relação entre baixos níveis de QVT com a ocorrência de queixas de dores musculoesqueléticas.
Considerando os impactos da qualidade de vida no trabalho sobre a saúde e o bem-estar dos policiais militares, bem como os prejuízos deste na capacidade laborativa dos profissionais de segurança pública propõe-se a realização de novos estudos a fim de promover melhorias nas condições de trabalho destes trabalhadores, por meio de novas estratégias de reconhecimento institucional e oportunidades de crescimento profissional mais efetivas.

Referências

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1 Especialista em Fisioterapia do Trabalho e Ergonomia, Oficial Fisioterapeuta da PMAL 
2 Mestranda em Ensino na Saúde, Assistente Social da UFAL
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